Se me perguntassem na minha volta ao Brasil por que motivo o mascote da Copa do Mundo de Futebol disputada em 1982 na Espanha era o "Naranjito", eu talvez não soubesse responder. Não saberia até a última semana. Agora sei. Inesperadamente raciocinei sobre.
Em Sevilla, Córdoba, Málaga e Granada - cidades andaluzas que conheci neste começo de fevereiro -, as laranjas são onipresentes. Laranjeiras carregadas de fruto perfilam os passeios que margeiam as ruas. Há laranjas no chão. Há laranjas no ar. Há laranjas que dão boas-vindas aos turistas em muitos - ou quase todos - pontos e locais históricos. Respira-se um perfume que, como bem gosto, dá um ótimo toque sinestésico à experiência incrível e inesquecível de conhecer tais lugares.
E é isso. Pois a Andaluzia é uma viagem de sensações. De ver, de cheirar, de ouvir, de tocar, de saborear. Tudo misturado na disposição ofertante, disponível a quem saiba capturar o que se oferece desde vários sentires.
"Desde vários", aliás, é algo muito espanhol. Não a variedade em si, que se tem sempre por onde se vai, em qualquer lugar. Mas o uso gramatical do "desde". Diferente do nosso, do português. Com mais conotações. Mais que temporal ou físico. Marco para outras situações. Um outro "a partir de".
E foi lá em Málaga, na sexta-feira passada, que recebi um email de Belo Horizonte com os seguintes dizeres: "Fred, sua ligação com a Espanha é de longa data. Um beijo, Mamãe". Havia uma imagem em anexo. Acompanhando as poucas palavras que muito diziam, uma foto daquelas que atravessa linhas de significado. Fazendo convergir num só foco, desde o sentimento, um tanto de coisa.
Nessas coincidências que não se explica, estava lá eu, em agosto de 1982, exatos 27 anos antes de chegar em território hispânico, em agosto de 2009. Na roupa, a Espanha. Na roupa, a laranja. Em tudo, tudo. Desde a lembrança materna e familiar, desde mim. Desde a Andaluzia. Desde os significados...
Talvez eu diga que essas coisas só acontecem comigo porque eu as enxergo dessa maneira. E no fundo é isso. O "só acontecer com a gente" tem muito a ver com o "ver o tudo". Pois se acontece, damos sentido. Faço isso, pois. Muita gente faz.
Nos meus sentidos de fé, ando cada dia mais agradecendo ao meu "anjo-da-guarda". Que tem "trabalhado" muito bem, creio. Numa crescente, acho. Eu comentei sobre isso com o Reges, meu companheiro de viagem pelo sul espanhol. Falei com ele, num momento "cabeça", dessa "proteção que nos acompanha", dos "privilégios", das convergências e de como estas se formam "desde" coisas que estão espalhadas e são partilhadas.
Hoje faz seis meses que cheguei aqui. Agora falta menos de um para fechar o ciclo. Na tessitura quase completa, "llena" de incompletudes, não cansarei de dizer a muitos, "una vez más": obrigado!
Rua Lavras e Naranjito. Belo Horizonte, Brasil, agosto de 1982.
Um comentário:
Quando vi a foto da R. Lavras, e antes de ler o texto, pensei: "Ai, ai ai... o Fred levou o armário dele para a Europa!" Depois de descobrir a origem da foto, o que me assustou foi a memória da D. Izar! E pensar que a Espanha em peso contestou o Naranjito, pois queriam um touro enfurecido para seu cargo. Sempre a desproposital virilidade... desde as frustrações.
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